Diários Noturnos

Diários Noturnos

26 de setembro de 2016

AMOR SEM BISTURI

I

Sinto a sua falta
mesmo que falta 
não me faça


Queria lembrar do futuro
Saudade de quem serei
Do passado o cheiro 
queimado da desgraça


Na piscina da infância
De olhos mareados 
Fui Iemanjá-Sereia


Deitada no tapete
Distribuía conchas 
Escutava sete vezes 
as ondas AS ONDAS
AS ONDAS as ondas
as ondAS AS OndAS


aS ONDAs
Molhavam o ar 
pelo som portátil
Felicidade mora fora 
da realidade tátil


Beija aqui 
Beija aqui também

Tua língua é a coisa 
mais zoológica
do céu da minha boca


Gruda a tua à minha
Tem nome a nossa história:
Amor sem bisturi

Faz um silêncio
quando a minha língua 
esvazia-se da tua

Dá para encher
um balde de saliva

Pinga
Pinga
Pinga
saliva

II


A saudade
atrapalha o silêncio
Inquieta fico.


Lembra-se?
Lembrar-se-á, 
será?


Você falava
com minha língua
Viver de memória
é apocalíptico


Será culpa?
Sou antiviva?

Nado no sentido
Anti-horário do tempo
Cronos Ilógico


Vestida com roupa velha 
curta e descolorida 
de lavar e passar
meu passado


Tanto lamento
não ser quem eu seria
se tivesse escolhido
virar à esquerda,
seguindo o termômetro
que mede o revólver
do meu sonho

Sistema límbico,
meu justiceiro,
cultivar os anos 70
em pleno século XXI
É voltar a ter 
os meus/os seus
dezessete
fora de época
em 2006


III


Pendurei
um espelho
nas costas



Passei
a não ver 
meus rostos

Impedida 
pelo
corpo

Quis
não ser
corpo

IV

Mesmo que falta não me faça
desfaço-me da tua ausência
no gerúndio da saudade
que não é verbo

No buraco
da existência
A nostalgia
da queda

Perigo é
viver a falha
da gravidade

Ajo
Sinto
Penso
Desejo

Me dê de presente 
A sua presença
No presente

 
Pensei
Desejei
Senti
Fiz e aconteci

Cortei
o passado
com bisturi.

O que vi
no espelho
eu lambi.

Quanto prazer

poder ser
desembrulhado
presente
de si.




Nenhum comentário:

Postar um comentário

Quem (sol) eu:

Minha foto
'O ar está tão carregado de espíritos que não sabemos como lhes escapar.'(Goethe in Fausto)

Seguidores